
CARTA ABERTA:
O futuro que queremos;
Uma carta de jovens portugueses ao país
Objetivo da carta: Na sequência da conjuntura socioeconómica gerada pela COVID19, mostrar, à sociedade portuguesa e ao governo, a posição coletiva e assertiva de um número significativo de jovens portugueses, sobre o futuro que queremos herdar e as medidas necessárias para lá chegar;
Assinante & Apoiante: Os assinantes da carta são jovens até aos 35 anos ou organizações sem fins lucrativos lideradas por jovens; os apoiantes são outras pessoas e organizações que apoiam a carta e o seu conteúdo.
CARTA ABERTA:
É difícil, e talvez perigoso, olhar para a realidade que hoje vivemos como uma oportunidade de reflexão, quando para muitos esta é uma altura de imprevisibilidade e enormes dificuldades financeiras. Mas esta crise pandémica é um alerta sem precedentes que pôs a nu a vulnerabilidade das nossas sociedades. Por essa razão, como geração que irá herdar os resultados das decisões tomadas hoje, não podíamos deixar de escrever esta carta, para reivindicar uma recuperação que nos garanta um futuro sustentável.
Embora ainda estejamos no olho da tempestade, há uma outra profunda emergência a decorrer em paralelo: a crise climática. Uma crise que também chega a todas as fronteiras e classes sociais, que também agrava ainda mais as desigualdades já existentes e, que também foi prevista por cientistas e organizações internacionais, desvalorizada por governos e empresas, e cuja resolução exige respostas coordenadas a nível global.
Se nada mudarmos, para além do risco de crises epidémicas ser cada vez maior, o número de fenómenos meteorológicos extremos continuará a aumentar e os solos tornar-se-ão cada vez menos férteis, num mundo que espera vir a receber mais 26% de pessoas até 2050. Fogos como os de 2017 serão mais comuns e o nível das águas do mar continuará a aumentar, algo especialmente relevante para Portugal, onde a maioria da população vive no litoral. E tudo isto abalará milhares de milhões de vidas, a nossa saúde e a economia global. Tal como o novo coronavírus.
A crise pandémica lembra-nos uma verdade eterna: a natureza é o nosso verdadeiro seguro de vida. Por isso, o derradeiro teste é o que se segue. Neste momento, os governos de todo o mundo estão a tomar decisões que irão influenciar a história da humanidade. Sabemos que as atuais necessidades dos cidadãos e dos governos são muitas, e com elas cresce a tentação de resolver os problemas com soluções de curto prazo. No entanto, o que precisamos é aproveitar este tempo para construir um futuro resiliente, preparado para mitigar riscos já identificados pela ciência, que há muito apontavam as crises epidémicas e as alterações climáticas como duas das maiores ameaças para as nossas sociedades.
Por essa razão, este não é o momento para recuar os objetivos de políticas verdes já delineados. Esta é a altura certa para construir um novo caminho, assente num modelo económico mais justo e inclusivo, que tenha como base o equilíbrio e respeito pelos limites do planeta. Esta é a hora para fazer cumprir o Pacto Ecológico Europeu (European Green Deal), o Acordo de Paris e o Roteiro de Neutralidade Carbónica, como linhas orientadoras para a ação, reforçando a sua
ambição, para conter as alterações climáticas até 1,5ºC, face à temperatura média global pré-industrial. Somos um grupo de jovens e organizações juvenis, de diversas áreas, que exige uma recuperação socioeconómica justa e sustentável. Seguindo o consenso científico amplamente comunicado em alertas de organizações nacionais e internacionais, desafiamos o país a agir por uma nova normalidade, resolvendo:
Alinhar as políticas fiscais com o objetivo de efetivar a transição energética, de combustíveis fósseis para 100% energia renovável;
O Estado deve eliminar subsídios aos combustíveis fósseis e outras formas de apoio a indústrias poluentes e aplicar o princípio de que quem polui paga, aplicando ou aumentando as taxas de carbono. Ao fazê-lo deverá garantir a requalificação dos trabalhadores dessas indústrias, preferencialmente para o setor das energias renováveis. Além disso, numa altura em que o Estado terá de injetar dinheiro de todos no setor privado, deveremos exigir dessas empresas contrapartidas que garantam a sua transição energética e uma maior eficiência no uso de recursos.
Favorecer o investimento e financiamento ao desenvolvimento e implementação de tecnologias limpas;
Para nos ajudar nesta transição, as empresas e o Estado devem investir no desenvolvimento tecnológico e implementação em escala de soluções neutras em carbono, com menor consumo de energia e que favoreçam a economia circular. São exemplos o investimento em mais e melhores transportes coletivos eletrificados, o aumento de vida útil dos produtos e matérias primas e o aumento da reciclabilidade dos mesmos. Além disso, na gestão, nas decisões de investimento e nas análises de risco, é imperativo considerar sempre os impactos sociais e ambientais, algo já comprovado como economicamente rentável. Com todas estas medidas, estaremos também a apostar na criação de empregos verdes, necessário para garantir uma transição justa, que não deixe ninguém para trás.
Apostar nos serviços dos ecossistemas e na biodiversidade, como valor para o desenvolvimento económico;
É fundamental preservar os ecossistemas que sequestram e armazenam carbono natural e aumentar as condições de conservação e restauro da natureza, não só em áreas protegidas mas também fora delas, como nas zonas florestais, agrícolas, urbanas e costeiras. A valorização económica do capital natural e humano deve ser ainda assegurada, por exemplo, refletindo-o no PIB ou através da adoção de um indicador complementar que meça também o grau de desenvolvimento sustentável.
Disseminar a temática do desenvolvimento sustentável e incentivar a participação pública acessível a todos;
Ensinar o desenvolvimento sustentável de forma transversal em todas as áreas do ensino superior, uma vez que todos os setores da sociedade são fulcrais para alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável até 2030 e, promover ativamente a participação pública, de forma a garantir uma representação plena dos interesses de todos.
Por último, como cidadãos, precisamos de lutar pelo futuro que queremos de forma determinada. Através do nosso voto, das nossas escolhas do dia-a-dia, de manifestações, ou de cartas como esta. Porque os cidadãos de uma democracia, quando agem coletivamente, são quem mais ordena. Não podemos esperar mais, este é o momento.
Junta-te a nós, por uma nova normalidade.